Funcionário público? Nunca mais!

Esta poderia ser unicamente a expressão que encerra o poema intitulado O Corvo, de Edgar Allan Poe, traduzido por Machado de Assis: Nunca mais! No poema este é o nome da ave que crocita agourando a morte de Lenora, musa inspiradora do bardo. No entanto, para nós, aqui no Brasil, este agouro é o canto de cisne do nosso Estado-nacional.
Quem em sã consciência colocaria seu futuro numa atividade que poderia ser atropelada no começo, pelo meio ou no fim, pelo seu decreto de extinção? Mal comparando, é repetir o gesto de Collor, contra a segurança e estabilidade jurídica, quando confiscou a poupança da cidadania.
Pois este é o destino que endereçam aos funcionários quando pensam, com relação à sua aposentadoria, confiscá-la, como um direito despiciendo ao Estado Democrático de Direito.
O corvo de Poe não crocita seus maus augúrios somente sobre o pesadelo da saudade insepulta da Lenora do poeta. Crocita debruçado sobre os restos mortais do Estado Nacional Brasileiro.
Os globalizadores Alvin Tofler e Keinichi Ohmae, como pitonisas, predisseram em suas obras, respectivamente, "A Terceira Onda" e "O Fim do Estado Nacional", a passagem do Estado Real para o Estado Virtual, com todas as conseqüências da conotatividade deste cenário catastrófico de "day after".
Quem, em sã consciência se animaria a ter restrições e impedimentos, em suas atividades, como a de não poder advogar, não poder comerciar, não poder acumular cargos, não poder viajar para o exterior sem licença prévia nem mesmo em férias, não poder ser sócio e muito menos sócio-gerente? Ter obrigações de recolher o imposto diretamente na fonte, sem choro nem vela?
Declarar todo o ano, perante o ente de controle interno, a relação de seus bens, para ver se não enriqueceu ilicitamente ou mesmo se a origem de seus ingressos não é fruto de corrupção no serviço público ou de crime concomitante?
Ser convocado, sem aviso prévio, a qualquer instante e encerrar férias ou licenças, com base na necessidade do serviço público?
Deveres de hombridade, honestidade e a declaração de cidadania através da comprovação do voto, em toda a eleição, perante a repartição, sob pena de não receber seus estipêndios no mês? Dever de urbanidade, de probidade, no atendimento da cidadania e no trato da coisa pública e todo o mais que foi esquecido em troca do congelamento por oito anos de seu salário e a extinção de sua aposentadoria?
Desde da privatização e da desestatização, por tudo, cremos que este é o golpe de misericórdia nas possibilidades tanto da atividade meio como inclusive da atividade fim do Estado.
Ninguém que tenha esperança e idealize um futuro colocará seu sonho de realização e vida numa profissão ou função que só se reduz, nas condições atuais, a uma verdadeira "capitis diminutio" romana.
Desapossado do "status libertatis" e do "status civitae" em breve, não terá mais possibilidade, muito menos ao "status familiae", pois quem, em são consciência, terá o ensandecido devaneio de ainda amar e por cima ainda casar com um verdadeiro perieco romano ou grego esbugalhado de seus direitos e enriquecido de deveres? Encerrada a correlação e o equilíbrio entre os direitos e os deveres, com a predominância dos últimos, reduzir-se-á, esta categoria a um regime de subcidadania. Portanto, parodiando Poe, em seu poema dirigido a Lenora, ainda secando uma última lágrima sob o som de um réquiem de adeus, veremos passar o féretro do Estado Nacional e o saudaremos com uma última expressão de adeus: Nunca mais!

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