"Reforma" no tranco porque sabem que estão errados

"Reforma" no tranco porque sabem que estão errados
Por onde quer que olhemos os números, sejam eles quais forem, parece inegável que o governo emplacou sua reforminha tão somente para cumprir compromissos externos. Se realmente tivesse interesse em organizar a Previdência Social - seja dos celetistas ou dos servidores - o caminho seria outro, bem mais condizente com a seriedade no trato de matéria tão importante para a sobrevivência de um sistema decente de aposentadoria e pensões em nosso país.
Antes de impor aos aposentados e pensionistas um desconto sem destinação nenhuma, um governo sério trataria de cobrar dos devedores da Previdência alguns dos quais, pasme, são órgãos oficiais, como a Caixa Econômica e o Governo do Estado de Goiás. E apertaria o cerco para detectar sonegações e fraudes, que equivalem a 40% das receitas atuais, segundo estimativas dos técnicos do setor. De quebra, daria um basta a renúncias fiscais descabidas, que somam muito mais do que a economia que pretende fazer, ao arrepio da Constituição, reduzindo os benefícios.
Se tivesse o mínimo de seriedade em suas propostas, o governo iria procurar um jeito de atrair para a Previdência mais de 50 milhões de brasileiros que, na atividade informal, autônoma ou em ramos tradicionais de sonegação, não contribuem com nada. Mas vão recorrer aos mesmos cofres quando completarem a idade do benefício assistencial universalizado. Embora fale nos menos favorecidos com uma sem cerimônia de arrepiar, o governo do PT passou ao largo desse quadro, deixando de oferecer uma alternativa de inclusão social dessa massa na Previdência.
O que interessa mesmo, conforme se deduz dessas mensagens levadas ao Congresso com toda a pompa, é reduzir os direitos dos servidores para jogá-los nos braços dos banqueiros que controlam os fundos de pensões, hoje um dos 5 melhores negócios do mundo. E criar um clima em que jogam a sociedade contra os servidores, como se esses fossem os culpados dos juros extorsivos que o governo paga aos banqueiros, sem chiar.
Essa pressa não é à toa
Você deve ter ouvido, por mais de uma vez, o Lula falar contra os apressados em medidas de alcance social prometidas na campanha eleitoral. Ao contrário de seus juramentos em palanque, ao invés de começar a abrir caminho para os dez milhões de empregos constantes do seu programa, o governo está seguindo o mesmo caminho que aumenta a crise, optando pelo aumento dos juros e o asfixiamento da atividade econômica. Para retomar o desenvolvimento que abrirá frentes de trabalho, o governo petista exige paciência.
O mesmo acontece com programas educacionais e o próprio ministro Cristóvão Buarque levou um pito, com uma frase chula, que, aliás, de vez em quando sai dos lábios presidenciais. Da reforma agrária, nem fumacinha. Aliás, a última do Lula é prometer aos grandes fazendeiros que fará a sua reforminha de comum acordo, da maneira mais "light" possível.
Já para a chamada reforma da previdência, a conversa é outra. O governo está disposto a fazer os congressistas trabalharem até no recesso de julho para forçar uma aprovação sumária, antes que a sociedade, devidamente esclarecida, caia na real e reaja de forma mais ampla à mentirada exposta por canastrões sem muitas convicções.
Ao jogar todo o peso de sua máquina e das máquinas dos 27 governadores, além da mídia e dos empresários - alguns dos quais devedores da Previdência - o governo sabe que só aprova suas propostas no tranco. Por isso, não se constrange em usar métodos de intimidação e pressão sobre seus próprios parlamentares, dos quais exige que neguem tudo o que disseram até ontem, sob pena de serem expulsos do partido que tem a chave do cofre e o mapa das sinecuras.
Como pode o governo explicar ao país que o Estado de Goiás é o segundo maior devedor do INSS com nada menos de R$685.872.551,00, mais do que a Previdência economizaria em um ano de desconto dos aposentados?
Como pode explicar que a estatal CONAB está em sétimo lugar entre os devedores, com R$454.025.969,00 e até a Caixa Econômica Federal deve à Previdência R$358.133.514,00?
Como pode uma companhia de limpeza urbana continuar prestando serviço à Prefeitura de Salvador, se ela deve R$344.701.431,00, e pela Legislação nenhum devedor da Previdência pode trabalhar para órgãos públicos?
A questão da dívida é um negócio tão imoral, há tanta cumplicidade, que em entrevista à "Folha de São Paulo", domingo passado, o procurador-geral do INSS admitiu que pretende dedicar atenção especial à dívida dos pequenos devedores, embora contabilize R$ 864 milhões de débitos de todos aqueles que devem entre R$3.000 e R$10 mil.
A expectativa é que eles paguem. Os grandes devedores continuarão a salvo. Por que? Será por que entre eles há vários integrantes do biônico Conselho Econômico e Social? Será por que entre eles há bancos que contribuíram para campanhas eleitorais dos candidatos presidenciais?
O recurso da manipulação
O governo sabe que manipula números de forma imoral e desonesta. Outro dia, o senador Aloísio Mercadante, que ameaça o país com declarações bombásticas, deu a entender, com absoluta má fé, que há um milhão de servidores com aposentadorias de 53 mil reais. Pior é que muita gente pensa isso, agora.
O governo sabe que a história dos servidores não tem nada com o que diz aos cidadãos. O contrato do estatutário sempre foi um grande negócio para o erário: além de se eximir da contra-partida patronal na contribuição ao INSS, deixando esse gasto para o fim da linha, também não tem que bancar um Fundo de Garantia, que é uma verdadeira aposentadoria complementar para os celetistas.
Muitas prefeituras e governos estaduais fizeram leis específicas de transformação de empregos em cargos porque não queriam nem ouvir falar em contrapartida e não pretendiam dar o calote, com o governo de Goiás e outros órgãos públicos.
Se o governo não tivesse agindo tão somente porque está amarrado, pés e mãos, ao FMI e ao famigerado "Diálogo Interamericano", abriria a caixa preta da Previdência, inclusive dos servidores públicos. Neste caso, propositalmente, o governo esconde:
1. Quem nunca "capitalizou" para a previdência foi o Tesouro. Os servidores contribuem desde o primeiro montepio, em 1835, criado pelo Regente Feijó.
2. Com a unificação dos institutos, embora mantivesse o regime próprio dos servidores, a ditadura rapinou o IPASE, que durante 29 anos recolheu dinheiro certinho de todos os funcionários. Cadê esse dinheiro? O bicho comeu? Cadê o patrimônio imobiliário do IPASE? E seus demais ativos?
3. O governo esconde que hoje se aplica aos servidores, em todas as instâncias, um ardil destinado a burlar a paridade entre ativos e inativos. No contra-cheque dos funcionários, há penduricalhos que não entram para a aposentadoria. Em alguns casos, esses penduricalhos são maiores do que os vencimentos. Como pode o governo dizer agora que a aposentadoria é maior do que o vencimento da ativa?
4. Quando o governo fixa um piso para o desconto, ele está querendo apenas quebrar a irredutibilidade dos benefícios, abrindo um precedente legal. Quebrado o direito, o próximo passo será atingir a todos, até porque essa "reforma" é uma novela que começou com Collor, em 1990, passou por algumas emendas e teria sido concluída com a Emenda 20.
Já que as famosas pesquisas dizem que o povo está adorando o governo, que tal tirar a máscara e dizer o que realmente pretendem com esse massacre dos servidores e dos aponsentados?

[Voltar]

www.guahyba.vet.br