A aposentadoria dos servidores

Assim como Bush vai usar qualquer pretexto para pôr a mão no petróleo do Iraque, os banqueiros, donos do Brasil, vão se servir da manipulação dos números para passar um rodo no Estado, fragilizando sua coluna dorsal - o funcionalismo - e tornando-o presa fácil de seus interesses insaciáveis.
Toda essa catilinária espargida sobre a opinião pública contra o contrato dos servidores, civis e militares, é um jogo sujo de cartas marcadas. Faz parte dos compromissos firmados com o FMI, carro-chefe do sistema financeiro internacional, assumidos pelo governo FHC e chancelados pelos candidatos à Presidência, naquela tarde fatídica em que todos foram ao Planalto dizer amém, sob pena de darem pretexto a uma conspiração perversa do "mercado".
Quem se der ao trabalho de fazer cálculos - algo infelizmente fora de moda - vai ver que a sociedade não arca com um centavo a mais na aposentadoria integral dos servidores, que descontam 11% dos seus vencimentos para ter esse benefício. Os novos mandantes sabem disso muito bem. Brandiam antes, quando estavam na oposição. Se mudaram o discurso não é porque esqueceram a matemática.
Um país seqüestrado
O Brasil, coitado, foi seqüestrado pelo sistema internacional e falta coragem e competência para recusar o pagamento do resgate. Não é por acaso que repetem a palavra PRIVILÉGIO para estigmatizar direitos pétreos, consagrados ao longo de nossa história constitucional. Essa palavra tem o odor de um palavrão e, a partir dela, a opinião pública é induzida a uma síndrome pestilenta. Submetida à lavagem cerebral, em vez de constatar que está sendo surrupiada pelos corruptos que minaram a Previdência, em função de que padecem de aposentadorias e pensões esquálidas, a massa acredita que toda a tragédia brasileira é gerada "por uma casta de servidores privilegiados".
Se você se acha cidadão, se não outorgou a terceiros o exercício da avaliação, convido-o a acompanhar os cálculos que me foram enviados por profissionais sérios e altamente responsáveis. (Informo, desde já, que estou disponibilizando todos os e-mails e material que tenho recebido na minha página www.pedroporfirio.com).
Veja alguns trechos do estudo desenvolvido por quem se debruçou sobre os números com a maior honestidade: "A título de exemplo, consideremos a hipótese de um funcionário público com um salário de R$5.000,00 (cinco mil reais) contribuindo, durante 35 anos, com 11%. Sua contribuição mensal seria de R$550,00. Ao longo do tempo de contribuição, se, sobre esses valores mensais, fossem aplicados apenas juros de 0,5%, como ganho real mínimo, o resultado seria um acumulado de R$780.000,00 (setecentos e oitenta mil reais), o que lhe garantiria uma renda vitalícia de R$3.900,00, em uma aplicação que só lhe rendesse o mesmo 0,5%.
Se os mesmos R$780.000,00 fossem aplicados em uma simples caderneta de poupança, o rendimento mensal saltaria para R$11.700,00, o que demonstra que a contribuição no percentual de 11% cobre, suficientemente, a aposentadoria de mais de um servidor, estando perfeitamente enquadrada nas regras atuariais.
Este é o cálculo mais modesto, porque, se a contribuição mensal dos mesmos R$550,00, durante 35 anos fosse aplicada na caderneta de poupança, considerando-se a situação atual, de inflação ainda baixa e de rendimento mensal em torno de 1,51% (aqui, há que se fazer uma correção, porque a poupança está rendendo hoje 0,87 ao mês), o resultado, ao longo do período indicado, seria da inacreditável soma de R$19.692.036,00 (dezenove milhões, seiscentos e noventa e dois mil e trinta e seis reais), o que significa dizer que o servidor público teria contribuído com R$46.885,82 mensais, para obter uma aposentadoria de R$5.000,00, tendo pago, a maior, durante o período, R$41.885,82, que correspondem a um percentual excedente de 737,73%.
Se esses mesmos R$19.692.036,00 fossem aplicados em uma caderneta de poupança, a renda mensal do servidor aposentado seria de R$295.380,54 (duzentos e noventa e cinco mil, trezentos e oitenta reais e cinqüenta e quatro centavos), o que lhe garantiria uma velhice de fazer inveja".
Um déficit muito estranho
É estranho, capcioso e desonesto falar em déficit previdenciário de forma tão leviana. Todo mundo sabe que saiu exatamente da Previdência dinheiro para obras da Itaipu, Ponte Rio-Niterói e Transamazônica. Em todo o mundo, os especuladores estão de olho na administração das aposentadorias e não é por acaso que os fundos de previdência privada estão entre os cinco segmentos mais fortes da economia, junto com petróleo, indústria automobilística, informática e tráfico de drogas.
A Lei nº 9.789, de 23.02.99, que estima a receita e fixou a despesa da União para o exercício financeiro de 1999, determinou o desvio da fabulosa soma de R$489.597.269,00 do Orçamento da Seguridade Social para a despesa total da União.
O dinheiro destinado ao pagamento das pensões foi desviado despudoradamente para a conta da União, tal como na época da construção de Brasília, da Transamazônica, exatamente no momento em que toda a mídia proclamava a sete ventos o "rombo" na Previdência.
Os bancos interessados na aposentadoria complementar, à semelhança do que ocorre em algumas estatais, oferecem planos mais atraentes do que o próprio erário. Antes de falar de um exemplo, vale lembrar que também nessa área os fundos de pensão deitaram e rolaram e, como tinha muito dinheiro em caixa, foram usados sem escrúpulos nas composições de privatizações. Foi o fundo do Banco do Brasil quem destinou a maior quantia para o faraônico projeto turístico de Sauípe, na Bahia, que não está dando retorno.
A revista "Veja" de 10 de agosto de 2001 publicou cálculos atuariais da seguradora do Unibanco, com projeções de aposentadoria: quem contribuísse com R$ 500,00 por 30 anos, teria direito a um benefício mensal de R$6.888,00. Com base nesses cálculos, um juiz escreveu aos seus colegas:
"Fazendo um paralelo com minha situação pessoal, contribuo para a previdência social dos servidores públicos da União desde os 19 anos. Hoje tenho 32. Minha contribuição atual mensal é de R$1.146,90. Desta forma, se seguirmos os mesmos parâmetros usados na reportagem, deveria ir para a inatividade com uma renda de mais de R$15.000,00. De acordo com tais projeções, todos nós temos um excesso de contribuição para a renda mensal que nos é prometida, ou seja, o mesmo rendimento da atividade.
Há ainda dois fatores que nos beneficiam. As seguradoras privadas visam lucro, inexistente na previdência pública. E mais, muito mais significativo: a União deve, constitucionalmente, repartir proporcionalmente conosco as contribuições para previdência, assim como os empregadores o fazem no Regime Geral.
Refazendo as contas por aproximação, levando em conta estes dois aspectos (ausência de fins lucrativos e o quinhão da União, nossa empregadora...), para uma contribuição mensal de R$2.000,00 (1.000 meus + 1.000 da União), e 35 anos anos de trabalho, acredito que os cálculos apontariam para uma renda mensal, na inatividade, superior a R$30.000,00 (!!!)".
Já havia combinado com a Editoria da TRIBUNA escrever somente às segundas-feiras, até o dia 15 de fevereiro. No entanto, a minha última coluna teve tal repercussão, recebi tantos e-mails, que estou disposto a fazer qualquer sacrifício para repassar a perplexidade e a revolta dos servidores injustiçados e revoltados.

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